just like heaven

Tudo parece ousado àquele que a nada se atreve, por isso... atreva-se!

20 abril 2001

Cheguei sabendo que comeria sopa de espinafre. Estava morrendo de vontade de comer a de abóbora, mas essa eles só fazem de vez em quando, e embora eu já tenha reclamado muito pra Magui, se não tem sopa de abóbora, então a sopa do dia é de espinafre. Sempre. Nem esperei o Romeu me entregar o cardápio, já fui logo dizendo pra ele me trazer a sopa de espinafre, porque eu sabia que a de abóbora não ia ter. E, pra minha enorme surpresa, mudaram a sopa – não era de abóbora, nem de espinafre. Eu adoro sopa, muito mesmo, desde criança. De qualquer coisa, com qualquer mistura suspeita de ingredientes, eu adoro. Acho que tem gosto de comida da minha avó, porque na casa dela o jantar é sempre o mesmo, só variando o sabor do líquido espesso que ocupa todo o fundo do prato. Mas me surpreendi. Não esperava encontrar um tipo de sopa diferente ali, fiquei pensando com meus botões que devia ter sobrado muita ervilha do dia anterior, e que por isso tinham decidido bater tudo num liquidificador pra poder servir como sopa. Estava boa, mas não era igual à minha preferida, aquela cor de laranja, adocicada, com bastante queijo ralado encima, e várias torradinhas numa mini cesta de madeira. Lembrei da cestinha que dei pro Musi, cheia de chocolates e guloseimas, por causa da páscoa. Preferi mil vezes a cesta dele do que aquela ali à minha frente, porque quando se fala de comida, todos sabem que pra mim não há nada igual a chocolate. Fico pensando se não será pela minha vida que isso acontece. E o que relaciona uma coisa à outra é o fato da minha vida ser exatamente como o chocolate: um pouco doce demais, um pouco bom demais, jamais enjoativo, certamente viciante. Não sei porque chocolate é assim, nem muito menos porque minha vida é assim. Simplesmente é, eu acho. Procuro saber o porquê das coisas que me intrigam, mas nem sempre é fácil encontrar respostas que satisfaçam. Minha ansiedade vem pela busca constante, but I still haven’t found what I’m looking for, e sequer sei o que procuro. E, apesar de saber que as respostas devem estar em meu interior, é muito mais fácil e parece muito mais gososo procurar em todo o meu redor. Como num livro, por exemplo. Patrícia Melo me inspira. Dá vontade de sair escrevendo tudo, qualquer coisa. Parece que é possível escrever como ela, só que diferente dela, entende? Não sei explicar melhor que isso o que sinto. Cócegas nos dedos e no cérebro, vontade de ir colocando as coisas aos poucos, ir mudando de assunto sem ninguém perceber, ir pensando em voz alta... Conheci alguém chamado Máiquel, em Angola, justo o mesmo nome do protagonista do livro que comecei a ler. O nome sempre me pareceu meio que maquiavélico... maiquel se confundindo com maquiavel, essas coisas. Todas as palavras que tem mais ou menos as mesmas letras me confundem, e acabam parecendo meio que aparentadas entre si. Mesmo com significados totalmente diferentes, na minha imaginação elas se fundem numa mesma família, e se crrelacionam, e se emprestam caractarísticas. Daí a impressão de Máiquel ser maquiavélico. E quem disse que não é possível? Everything is possible. Até uma capa maravilhosa como esta, do livro do Máiquel, onde não bastasse a presença dos sapatos (aos quais ninguém pode sair imune, porque acho que todo mundo têm um quê com sapatos), ainda há esse contraste perfeito de cores envolvendo o azul, o amarelo, a cor de goiaba (meio rosada, meio avermelhada) e o verde... Se algum dia eu puder fazer capa pra algo meu, tipo uma pasta ou um caderno, ou qualquer coisa do gênero, quero uma capa assim, como as estampas das minhas caixinhas preferidas: com cores vivas e brilhantes. Não é que eu não goste de combinações em preto&branco... é só que é muito fácil criar algo belo e interessante só com essas duas cor/faltadecor. Com o colorido é mais fácil cair na breguice e no mau gosto, mas ao se correr este risco, corre-se também o de produzir algo extremamente belo e maravilhoso, tal qual uma asa de borboleta ou esta capa intrigante. São poucos os livros cuja capa aprecio realmente. Triste, porque tem cada coisa bela e interessante pra se colocar na capa de algo, e tantas vezes há figuras tão mornas, com cores e letras mortas. A sopa de ervilhas tem uma cor assim, morna, verde amarronzado, tão diferente do laranja vibrante da minha sopa predileta. Dizem que a gente come com mais prazer quando gosta das cores que vê no prato. Não sei se o mesmo vale para a leitura... afinal de contas, quando se está lendo um livro a capa fica exatamente do lado oposto ao qual se vê. E enquanto penso em tudo isso, o fundo do prato aparece, as torradas acabam (e eu ainda com vontade de que aquela cestinha pudesse ser trocada por uma igualziha à que dei pro Musi!), e eu me vejo saindo do restaurante com o cheiro do Serginho (adivinhem... Cheiro Verde, lógico!) desejando ao Romeu um ótimo final de semana. Que pena que este livro da Patrícia seja também tão curtinho... queria eu que durasse mais! Não só o livro, mas a vontade de escrever, assim.