just like heaven

Tudo parece ousado àquele que a nada se atreve, por isso... atreva-se!

10 setembro 2003

igual mas diferente – uma outra versão do nosso (re)encontro

capítulo primeiro
em algum ponto, nos e-mails trocados, mario av disse que queria não só conversar, mas que também estava precisando de um colinho amigo. se por um lado me pareceu muito esquisito o mario estar insinuando que queria o meu colinho (explico já, já), por outro eu estava só há tempos, querendo mesmo um colinho amigo, e topei na hora. foi essa perspectiva mútua de carinho, acho eu, que impulsionou tão rapidamente a vontade da gente se encontrar! e vamos às explicações sobre a estranheza que me bateu quando pensei em dar colinho ao mario av... até então, achei sempre que o mario fosse uma pessoa de contato físico difícil. eu vivo abraçando e beijando os amigos, sabe? curto demais isso de ‘colinho grátis’ sempre que revejo alguém querido. e o mario sempre foi distante, dando beijinhos engraçados quando nos víamos nos encontros dos amigos em comum, beijinhos ‘disfarçados’ (com barulhinhos onomatopéicos de desenho animado!), de alguém que fica extremamente sem-graça e desconfortável com tão pouco contato físico. por isso, deduzi que ele não seria, jamais, daquele tipo de pessoa que eu abraçaria demoradamente algum dia, como faço com outras gentes próximas. daí ter surgido um certo estranhamento, mesmo, ele dizer que gostaria de um colinho meu!

além disso, vale a pena me estender um pouco mais e contar que, até então, eu jamais (em momento algum, mesmo) havia sequer cogitado a possibilidade remota de ver o mario como alguém ‘pra mim’! eu o via como geek demais, como sapiente demais, como estranho demais, como crítico demais, como interessante demais, como carinhoso de menos, como relaxado de menos. eu tinha a idéia de que ele era uma pessoa extremamente distante em relacionamentos. achava que ele não era exatamente uma pessoa de fácil convivência. e algum dia presenciei coisas chatas entre ele e a julinha a ponto de ter estranhado muito que um relacionamento assim desse certo. o fato é que o mario, pra mim, representava um cara inteligentíssimo a quem eu queria muito bem, perfeito pra ser amigo, perfeito pra conversar todas as idéias do mundo, perfeito pra debater, pra aprender, pra trocar. alguém que me despertava muita curiosidade, muito interesse, e com quem eu já tinha tido conversas fantásticas, mas só. nada além disso.

fiquei encantada com o vislumbre do colinho mútuo, principalmente por se tratar de um amigo que não representava nenhuma ameaça e com o qual eu jamais me envolveria (ah, se eu soubesse!). fiquei animada com a possibilidade de rever alguém que eu sempre achei fantástico, alguém com quem eu gostaria, sim, de ter mantido mais contato durante os anos. fiquei contente com o fato de poder conversar com alguém que não tem medo de expressar suas opiniões, alguém com quem eu poderia tranqüilamente falar de qualquer assunto, alguém interessante com coisas pra trocar. alguém que poderia me ajudar a entender um pouquinho melhor do que aconteceu com o gu+dri, e alguém que eu esperava poder ajudar nisso de fim de casamento, mostrando que não precisa ser tão ruim assim (olha como foi legal comigo, pode ser melhor ainda pra você, se souber aproveitar o que eu na época não via). e marcamos, então, de jantarmos juntos num dia frio de julho. primeira quarta-feira do mês, como eu disse.

fomos ao tandoor, restaurante indiano pertinho do meu trabalho e da casa dele. eu tinha prometido uma surpresinha por uma frase lindinha que ele tinha colocado em algum dos e-mails escritos (acho que justamente essa em que ele mencionava querer um colinho), e acabei levando uma caixinha dos incensos favoritos dele (o nag champa, meu segundo incenso preferido, que o melhor é, pra mim, um de baunilha escura). cheguei cinco minutos mais cedo (que eu sempre chego um pouquinho antes, com essa mania de não querer jamais me atrasar), e o marinho chegou dez minutinhos depois. ele estava diferente do que eu lembrava (cabelos curtíssimos em oposição ao mullet que ele diz que não usava, mas usava sim que eu lembro!). comemos, eu samosas deliciosas, ele um frango ao curry super picante. conversamos, um pouco sobre relacionamentos (seus porquês, suas características, seus desenvolvimentos, suas motivações, seus finais), sobre idéias, sobre amigos, sobre um sem-fim de coisas que não recordo mais. sem colinho, que nenhum dos dois sabia muito bem como ia ser essa coisa do colinho (e eu realmente achava que o mario era uma pessoa muito pouco aberta a contatos físicos!), só um encostar de cabeça dele no meu ombro. no final do jantar. ao que respondi com um breve cafuné naquele cabelo tão macio. alguém perguntou como ia ser aquilo do colinho, acho que foi ele, e eu devo ter respondido com um sonoro ‘não sei!’ (ou fui eu que perguntei, tendo ele respondido com um sonoro ‘ah, sei lá!’?)...

íamos embora, ele ficou realmente triste e comentou da vontade que ele não tinha de voltar pra casa tão cedo, pra uma casa que ele ainda divide com a julinha, onde ele não se sentia ‘em casa’. eram umas dez da noite, e o único lugar em que pude pensar pra que pudéssemos ter um bom papo sem muitas interrupções foi o fran’s café que fica ali perto do tandoor. pra lá fomos, e lá nos sentamos e nos abraçamos, em busca do desejado ‘colinho’. e aí começou toda a mudança de tudo. logo no primeiro abraço, que delícia abraçar alguém, mas que delícia maior ainda abraçar alguém querido, quentinho, de pele macia, com um cheiro bom. quem me conhece sabe que minha vida é toda feita de cheiros e cores. e eu pensei, imediatamente, ‘puts, que besteira, eu poderia realmente me apaixonar por alguém com um cheiro desses!’. cheguei a pensar em desistir do colinho. o mario, tão diferente de mim, não era alguém por quem eu quisesse me apaixonar! mas me deixei ficar no abraço dele, envolta naquele carinho gostoso e quente numa noite invernal.

ele estava todo elegante, com aquele sobretudo preto pesado e quente. estávamos sentados lado-a-lado em cadeiras plásticas, na calçada do fran’s. tomamos chás. e nos abraçamos longamente. longamente. longamente. sem muitas palavras, se minha memória não falha. sem pressa, sem interrupções, sem receios, só aproveitando. com direito a beijinhos no rosto, no pescoço, beijinhos de amigos que já não são assim tão só amigos, mas que poderiam continuar sendo, eu pensava. pura ternura e carinho, quando é que eu podia imaginar que mario av é pura ternura e carinho? tão gostosas aquelas horas de abraços e beijinhos e colinhos e cafunés no cabelo! um tempo que passou rápido e devagar ao mesmo tempo, porque foi a partir de então que essa coisa chamada tempo começou a se retorcer toda em minha vida, ficando irreconhecivelmente lenta e devagar ao mesmo tempo o tempo todo. e foi também a partir daí que eu pude ver cada vez mais o sorriso do mario. ele começou a sorrir, timidamente, aos poucos, e eu adorei aquilo. menino do sorriso bonito, ele. que não me deixava ir embora dali, eu que precisava acordar tão cedo no dia seguinte.