Fui até o blog dela porque tem mar no título, e minha paixão por esse azul imenso e infinito me levou até a Suzi. Li um pouquinho aqui, outro ali, ela gosta de escrever, essa menina, me senti perdida em meio a tantas letrinhas, fiquei achando que quem entra aqui pela primeira vez deve sentir mais ou menos a mesma coisa, ou não. Foi mais ou menos nessa hora que achei este poema, inteiramente copiado aqui, porque vale muito a pena... que coisas lindas as pessoas são capazes de produzir, não? Adorei a menina, o menino, a mulher, o homem, os encontros e desencontros, as perdas, os medos, e tudo mais. Almost cried. Não sei se tô mais sensível que o normal, ou se é mesmo tocante, o que ela escreveu. Às vezes as coisas se encaixam, fazem sentido, e chegam a um lugar nosso que pensávamos estar mais bem trancado e escondidinho... Lembro do Musi dizendo que somos todos clichês. Ele diz, eu lembro, que somos todos iguais,cópias do que já existiu e existe ainda. São os clichês que nos aproximam. Daí, o que nos afasta, então?
REENCONTRO
I. A MENINA E O HOMEM
A menina saiu do quarto,
atordoada com seus próprios passos,
com seu sorriso apagado.
Perguntou, chorosa, ao Homem
sentado na sala, com os braços em concha:
- A quem posso culpar, se me apagam o sorriso
sem que eu reaja, sem que eu veja
a borracha cruel e veloz
do tempo e dos defeitos meus?
Temerosa, a menina,
sentou-se pequena
na concha quente da sala,
com medo de que lhe apagassem
também o Amor.
“Amor tem sete faces”.
Tranqüilizou-lhe o Homem
com voz de maré alta;
repouso de luar e corações de meninas
cansadas e escondidas em corais
que brilham em dias claros
e cortam em noites frias.
A menina corou em sorrisos
que brotavam de seus olhos.
Sabia que amava-lhe – o Homem.
Mas ela menina, pequena, pequena
medrosa, mimada e má,
nada poderia Lhe dar, a não ser
perguntas tantas que O faziam
desatar Seus braços em concha
em um grande grito de impaciência.
E lhe apagavam o sorriso de novo,
e fugidia gritava palavras que O queimavam –
águas-vivas.
Salgava sua própria face, em protesto surdo;
largava-se no chão até silenciar
os gritos de angústia Dele; e
por fim, voltava para seus corais,
esconder-se do medo, da culpa e
da iminente e quase certa morte do Amor.
II. O MENINO E A MULHER
O menino entrou pela porta da sala
encharcado de suor e chuva,
os olhos em pânico, pois perdera novamente
seu guarda-chuva e sujara os sapatos novos.
Choroso, cansado, encontrou a Mulher
deitada em sua cama em flor.
Em dor, o menino recostou sua cabeça pesada
sobre os Seus seios mornos,
e adormeceu ouvindo velhas cantigas de Amor.
“Amor tem sete faces,
e todas me amedrontam.
O mundo, sete mil faces,
e só uma me ilumina.”
O menino acordou
à luz que lhe secava o corpo.
Fitou longamente os olhos da Mulher
e gritou por não poder atravessar
o sorriso incrustado em Seu rosto,
porque perdera, junto ao guarda-chuva,
as chaves em forma de estrela-do-mar.
A Mulher inerte abraçou-o,
aquecendo-lhe as mãos,
alisando-lhe o rosto.
Tranqüilizou-lhe a Mulher:
Eu vou mudar a tranca
do meu sorriso fugidio.
O menino surdo em não poder gritar
não ousou Lhe dizer que
Sua face não mais iluminava
as noites escuras;
que Seus cabelos lhe prendiam
em algas emaranhadas.
O menino saiu pela mesma porta que entrara,
fugindo da luz fraca e do cheiro de areia.
Pequeno, pequeno e impotente,
perdeu-se na multidão de mil faces,
em busca de seu guarda-chuva.
III. O HOMEM E A MULHER
O Homem entra pela porta.
A Mulher sai do quarto.
Entreolham-se pela primeira vez
desde a infância de um Amor precoce.
Recordam-se menino e menina,
choram calados pelo que não souberam
dizer, dar, perder, errar e aprender.
Recorda-se a menina de seus sorrisos apagados;
recorda-se o menino das mil faces que perdera.
Choram a mesma dor e o mesmo medo,
pelo mesmo Amor que Lhes mostrara
sua face mais escura – a que suplica morte,
a que não se sustenta mais neles:
menino e menina.
Movidos pela brisa do mar,
Homem e Mulher olham
para as cicatrizes mútuas,
de cortes em corais da noite,
de gritos surdos e molhados de chuva.
Cegos por razões dissonantes,
Eles (Nós) abraçam-se em concha,
e Se protegem da tempestade tortuosa
de pensamentos confusos e sentimentos claros
debaixo de um velho guarda-chuva.
E Se consolam na certeza
de que o Amor tem infinitas faces,
sem trancas, sem chaves, sem razão.
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